21 fevereiro, 2011

Jeffrey Wigand, o homem que sabia demais

A indústria do tabaco sempre esteve entre as maiores e mais poderosas do planeta. Com investimentos pesados em publicidade (implícita e explícita) e pesquisas para o desenvolvimento de novos meios de aumentar o poder de vício do tabaco, eles foram se enraizando em Governos, criando fortes lobbies para defender seus interesses, e recrutando os mais caros advogados para se defender das acusações que brotam mundo afora.

Uma das maiores demonstrações de força dessa indústria aconteceu em 1996, quando Jeffrey Wigand, um ex-executivo da Brown & Williamson, uma das maiores companhias do setor na época (sendo incorporada pela R.J. Reynolds em 2004) resolveu contar tudo o que sabia numa entrevista para o renomado "60 Minutes", programa da rede americana CBS News. Contrariando interesses corporativos, tanto da indústria do tabaco quanto da própria emissora, essa entrevista desencadeou um dos casos mais constrangedores da imprensa americana, provocando um terrível mal-estar no meio jornalístico.

Já para a indústria do tabaco a entrevista de Jeffrey Wigand causou um golpe muito maior. Com a população em choque pelas declarações do ex-executivo de que eram adicionados aditivos químicos ao tabaco para que o efeito da droga fosse potencializado, aumentando as chances do usuário se tornar dependente, uma avalanche de processos caiu sobre as corporações, ultrapassando os US$ 360 bilhões em indenizações.

"O Informante" ("The Insider", 1999), filme que teve seu roteiro baseado no artigo "The Man Who Knew Too Much", de Marie Brenner, originalmente publicado na revista Vanity Fair (leia aqui, em inglês), mostra como foi o desenrolar dessa história que marcou o povo americano pela arrogância e ganância da indústria do tabaco, e pela censura dentro de uma das maiores corporações de mídia daquele país.

Na direção o filme conta com Michael Mann, que tem em seu currículo "O Último dos Moicanos" e, mais recentemente, "Inimigos Públicos". Russell Crowe, mais gordo e envelhecido, como Jeffrey Wigand, papel que lhe rendeu indicações ao Oscar, Golden Globe e BAFTA de melhor ator, e Al Pacino como o produtor do "60 Minutes", Lowell Bergman.

A bagagem de "O Informante" conta ainda com mais seis indicações ao Oscar nas categorias de melhor filme, melhor diretor, melhor roteiro adaptado, melhor fotografia, melhor montagem e melhor som. Já no Golden Globe ele teve garantida as indicações para melhor filme drama, melhor diretor, melhor roteiro e melhor trilha sonora original.

17 fevereiro, 2011

Sangue para começar bem o dia


São 6h da manhã. Você acorda para o trabalho naquele clima de preguiça e sono tão característicos da vida moderna. Enquanto se arruma e saboreia um delicioso café-da-manhã para carregar suas energias para aguentar o dia que começa, você liga a TV para saber das notícias do dia anterior que não teve tempo de prestar atenção, e para saber como está o trânsito que o espera no longo caminho até o trabalho. Zapeando pelos canais em busca de algo informativo você só encontra desenhos, Telecurso, programas de igrejas evangélicas, até que... finalmente! Você sintoniza no "São Paulo no Ar", o jornalístico matinal da TV Record transmitido para a Grande São Paulo. Então você pensa "Ufa! Finalmente poderei me informar um pouco nessa manhã gostosa". Ledo engano, meu caro. O "São Paulo no Ar" é a versão matinal do odioso "Brasil Urgente" (Band). Sua pauta é baseada em assassinatos, roubos, acidentes com automóveis e sequestros. É uma imensidão de desgraças apresentadas por William Travassos, no mais puro estilo Datena de ser.

Optar por um "mundo-cão matinal" não é exclusividade da TV Record. A Band tem em sua grade das manhãs o "Primeiro Jornal", apresentado por Luciano Faccioli, (ex-TV Record), que segue à risca a cartilha do sangue no café-da-manhã. E não é mera coincidência o apresentador também ter o puro estilo Datena de ser.

As únicas emissoras que fogem desse formato são a TV Globo, com seu aconchegante "Bom Dia Brasil", apresentado por Renato Machado e Renata Vasconcellos, e o SBT, com o "Jornal do SBT Manhã", uma espécie de clone matinal do "SBT Brasil", apresentado por Hermano Henning e Analice Nicolau. Desses dois o destaque maior fica com o "Bom Dia Brasil", que tem como formato um gostoso bate-papo entre os apresentadores, comentaristas e convidados. As matérias são leves, informativas e são apresentadas de forma agradável, sem os excessos que vemos no "São Paulo no Ar". E ainda assim conquista bons números de audiência.

O chamado "mundo-cão" sempre dominou a TV aberta brasileira. Durante anos esse formato jornalístico com claro apelo popularesco foi a carta na manga das emissoras para alavancar a audiência a qualquer custo. Com os números crescentes vieram também as críticas e protestos devido a qualidade duvidosa do conteúdo veiculado nesses programas, causando a debandada de patrocinadores, o que levou o formato à decadência, com algumas emissoras aposentando seus programas, ou repensando seu conteúdo. Já outras, não satisfeitas apenas com seus jornalísticos vespertinos, resolveram levar para as manhãs esse jornalismo de quinta categoria que em nada acrescenta à TV aberta. É aquela velha história de que colocar qualquer coisa no ar é um caminho mais fácil e mais rápido do que pensar em algo melhor. E depois não entendem porque o SBT consegue tanta audiência apenas colocando "Chaves" às 6h da manhã...

05 fevereiro, 2011

Como escrever uma novela

Passo 1: personagens

A novela deverá ser dividida em núcleos: "cômico", "pobre", "rico" e "romântico". Personagens pobres raramente interagem com os personagens ricos, salvo algumas situações. A interação entre pobres e ricos só é mais bem aceita dentro do núcleo "cômico" ou "romântico" (o mocinho e mocinha deverão sempre ser de classes sociais diferentes).
Os personagens do núcleo "cômico" deverão ser sempre caricatos e espalhafatosos. Não esqueça de incluir também personagens polêmicos: a puta do bairro, o viadinho afetado (esse deverá sempre fazer parte do núcleo "cômico"), etc.
E nunca, jamais, em hipótese alguma, esqueça de definir os mocinhos e os vilões, sendo os vilões sempre do núcleo "rico" e o mais caricato possível.
Lembre-se de que os personagens do núcleo "rico" NUNCA trabalham.


Passo 2: local das histórias

As histórias devem se desenrolar em torno de empresas ou cidades interioranas fictícias (se envolver uma empresa numa cidade interiorana melhor ainda). A história principal deve, obrigatoriamente, envolver o núcleo "rico" e "romântico". Qualquer coisa fora desse eixo é pouco aceito pelo público.
Não importa se o personagem é do núcleo "pobre" ou "rico", ele deve sempre morar em casas grandiosas e bonitas.


Passo 3: brigas e intrigas

Se sua novela não tiver brigas entre mulheres por causa de homem ou intrigas amorosas ela dificilmente fará sucesso.
É recomendado ter brigas por poder dentro do núcleo "rico". Caso sua história envolva uma empresa é obrigatório que as brigas sejam de personagens querendo o controle dela.


Passo 4: "merchandising"

Uma coisa muito em voga hoje em dia é o "merchandising", que é a odiosa forma de vender um produto do jeito mais tosco e ridículo possível: no meio da novela, fazendo os personagens pararem tudo o que estão fazendo para falar dos benefícios de determinado produto.
A grande moda do momento é incluir também o chamado "merchandising social", que é a forma que as emissoras arrumaram para tratar de assuntos polêmicos ou delicados, sempre didaticamente, como se o público fosse eternamente imbecil e incapaz de raciocinar sozinho.


Passo 5: enchendo linguiça

A novela deverá ter até 2 festas por mês, no núcleo "pobre" ou "rico". É recomendado que cada festa demore pelo menos 4 capítulos, dando assim a oportunidade de você disfarçar a falta de ideias para continuar a história.
Outra tática muito em voga no momento é encher metade do capítulo com cenas aéreas mostrando as paisagens, ou colocar os personagens do núcleo "romântico" em cenas em que ficam por vários e intermináveis minutos pensando na pessoa amada (recomenda-se essas cenas para momentos de choro).


Passo 6: diálogos enfadonhos

Tendo em mente que seu público é um pouco preguiçoso coloque os personagens explicando ao máximo possível o que está acontecendo na história. Quanto mais explicadinho mais o público será receptivo.
Não poupe conversa fiada. Quanto mais os diálogos entre os personagens forem cheios de frivolidades, inutilidades e papo meia-boca menos trabalho você terá para pensar no que escrever para o resto do roteiro.


Passo 7: morte do vilão

Não importando qual rumo a história leve, você deverá escolher 2 possíveis fins para o vilão: morrer (em um acidente ou assassinado) ou fugir para a Europa.


Passo 8: casamentos e finais felizes

Todos os núcleos deverão ter casamentos. Essa é uma regra mais do que obrigatória, não esquecendo que o casamento principal é o do núcleo "romântico", do mocinho com a mocinha. Esse casamento deverá sempre encerrar o último capítulo.
Nenhum personagem de nenhum núcleo (exceto os vilões) deverá ficar sem um final feliz.


Pronto, seguindo essas dicas você estará no caminho certo para escrever a próxima novela das 8.
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